quarta-feira, 24 de agosto de 2011

HISTORIA DE ITABORAÍ PARTE 2

Itaboraí, cidade histórica do Estado do Rio de Janeiro, localizado na região metropolitana, tem o orgulho de ser o resultado de três importantes vilas do passado colonial e imperial do Brasil: A maior delas, a Vila de Santo Antônio de Sá, a 2ª formação do Rio de Janeiro, no recôncavo da Guanabara; A Vila de São de Itaboraí, inicialmente uma parada de tropeiros, e que mais tarde se tornaria o maior produtor açucareiro da região e principal entreposto comercial ligando o norte fluminense a capital da província; e a Vila de São José Del Rey (conhecida como São Barnabé, ou Itambi), cuja região fora uma importante Missão Jesuítica entre os índios Tamoios que por aqui habitavam.
Para entender a história de Itaboraí, é importante entender como se deu o povoamento de toda a região, e que a ocupação territorial foi condicionada a diversas variáveis, como a proximidade de rios navegáveis, como foi o sertão do Macacu, ou mesmo de fins catequistas, como foi a dos Jesuítas na região de Cabuçú e Itambi, ou a localizações estratégicas em rotas de tropeiros, como foi o caso de Itaboraí, o que também acabou beneficiando o desenvolvimento econômico com os grandes engenhos, dentre outras razões.

Ruínas do Convento de São Boaventura na antiga Vila de Santo Antônio de Sá
                                                                                              
É no século XVI que se dá a ocupação dos “sertões do Rio Macacu” pelos colonizadores portugueses, pois em 1567 o fidalgo português Miguel de Moura recebeu uma sesmaria (grande extensão de terras) na planície do Rio Macacu (José Matoso Maia Forte - 1937). Entretanto, apesar da abertura de fazendas e engenhos de cana-de-açúcar na região*, o primeiro povoamento no Recôncavo da Guanabara foi a Vila de Santo Antônio de Sá, fundada em 1697, às margens do Rio Macacu.
*O ato de criação da vila de Santo Antônio de Sá seria uma mera curiosidade histórica não fosse o fato de que a descrição da solenidade constitui uma fonte rica de informações sobre a estrutura social que estava sendo criada no sertão do Macacu. Não só a maior parte das terras pertenciam a um grupo muito pequeno de indivíduos, como os laços familiares entre eles garantiam o controle das terras, fosse por casamento ou herança. Assim estavam presentes naquela solenidade membros das famílias dos Duque Estrada, dos Sardinha, dos Silva, dos Costa Soares, dos Pacheco e dos Azevedo Coutinho (às vezes escrito Azeredo Coutinho). Cada família era associada à uma parcela do território: por exemplo, os Azevedo Coutinho e os Sardinha eram donos de terras e engenhos em Itapacorá; os Sardinha também eram proprietários em Macacu e Guaxindiba, e assim por diante (Forte,1984).
A Vila de Santo Antônio de Sá, suas freguesias e povoados, experimentou um grande desenvolvimento econômico, parte por sua localização, tendo em toda região, entrepostos comerciais que recebiam, via escoamento fluvial, a sua produção; a da região serrana e interior fluminense, através de seus rios como o Macacu, Casseribu e Aldeia. Porém, anos de desmatamento desordenado, tornando as áreas aráveis em charcos, e o conseqüente assoreamento dos rios, não só foi destruindo o potencial produtivo, mas, também, cooperou na proliferação de mosquitos, vetores de doenças como a febre amarela e a malária, o que resultou, a partir de 1829 no início da extinção da Vila (então a mais atingida pelas doenças).  As “Febres do Macacu” foram tão marcantes que nos anos que se seguiram, as pessoas evitavam retornar ao lugar, devido ao medo que se instalou (Num ofício ao Marquês de Caravelas, que era Ministro e Secretário dos Negócios do Império, em 25 de agosto de 1830, Francisco José Alves Carneiro, Juiz de Fora da Vila de Sto Antônio de Sá, fazia saber sobre a Vila já se encontrar quase deserta, contando, talvez, com meia dúzia de homens, levando-se em conta que a Vila chegou a contar com uma população de 19.000 almas.

Capela da Fazenda Itapacorá –Séc. XIX
Com relação ao povoamento de Itaboraí, ou Tapacorá, como a região era conhecida, nas crônicas “Reminiscências de Itaboraí”, do escritor e acadêmico Salvador de Mendonça, e publicadas no jornal “O Brasil, de 1907”, o autor fala o seguinte sobre Itaboraí:
“No século XVII, o governador Salvador Corrêa de Sá mandou abrir a estrada de Campos dos Goytacases a Niterói. Essa estrada passava pela colina de Itaboraí, caminho de Vila Nova  e São Gonçalo. No alto da colina, à beira dessa estrada, havia uma fonte sob um bosque frondoso. Tornou-se esse lugar um ponto de parada para as tropas que por ali transitavam. Levantaram-se ranchos ao lado oposto da fonte, esses ranchos foram as primeiras casas itaboraienses. A fonte dera o nome ao lugar – ITABORAÏ que quer dizer “Pedra Bonita escondida na água”, e essa denominação nascera de haver no fundo da fonte, metido na pedra, um pedaço de quartzo que despertara a atenção dos índios do lugar.”
Defende-se que o altar-mor da igreja Matriz de São João fica exatamente sobre essa fonte, cujas águas foram encanadas, pela colina abaixo, até a “fonte da Carioca”, ao mesmo tempo que a igreja, e que ali ainda existe.
O surgimento do povoado se dá graças a essa parada de tropeiros que,  em 1672,  com  a inauguração da Capela de São João Batista, por iniciativa de tropeiros, em substituição a antiga capela da fazenda do Iguá, erguida por João Vaz Pereira em 1622, que ficava em Venda das Pedras, recebendo, inclusive, os seus retábulos.
Como podemos perceber, já existiam engenhos pela região, conforme descrito acima  na fundação da Vila de Santo Antônio de Sá. E esses engenhos de açúcar foram os responsáveis pelo desenvolvimento econômico de Itaboraí, sendo a principal atividade econômica do vale do Macacu-Casseribu na época colonial  (séculos XVIII e XIX), constituindo grandes engenhos. E durante a maior parte do século XIX e até meados do século XX com a usina de Tanguá, permaneceu como parte da paisagem apesar de perder gradativamente sua importância econômica. Também é preciso lembrar que o açúcar foi durante séculos um dos produtos tropicais mais valorizados no mercado estrangeiro. Por isso mesmo tornou-se o principal produto de exportação das pequenas colônias luso-brasileiras que foram sendo implantadas na costa atlântica, logo que os primeiros colonizadores verificaram a aptidão de algumas terras ao seu plantio.
Outra região que se destacou muito foi o povoado de Porto das Caixas, então ligado a Santo Antônio de Sá, e que surgiu no início do século XVIII, cujo nome não vem do acaso, e sim, o fato de ter se tornado um importante entreposto comercial, sendo o responsável pelo escoamento da produção agrícola de nossa região e o interior fluminense, chegando pelo Rio Aldeia e, no seu porto, a produção encaixotada, para o transporte à Europa. Com isso, o seu crescimento foi tal, que chegou até mesmo a contar com uma vida cultural muito ativa, contando, inclusive com dois teatros, e um comércio muito bem estabelecido. Contudo, com a inauguração da Estrada de Ferro ligando a Cantagalo em 1860, e a Estrada de Ferro Carril Niteroiense, em 1874, ligando Niterói ( então capital da Província do Rio de Janeiro ) diretamente ao interior fluminense, viabilizando o escoamento mais vantajoso da produção cafeeira da região de Cantagalo e Nova Friburgo, o antigo entreposto de Porto das Caixas e a Vila de São João de Itaboraí entraram em declínio, em consequência da decadência do transporte fluvial, associado às epidemias e ao fim do trabalho escravo ( decretado em 1888 ), ocasionando grandes prejuízos aos fazendeiros itaboraienses.

Estação de Visconde de Itaboraí
Enquanto os portos fluviais entravam em decadência, a chegada da estrada de ferro à então vila de Itaboraí deu um certo alento ao comercio e à industria das olarias e cerâmica, permitindo o crescimento urbano e sua transformação de vila em cidade.
No século XX, depois de um período de declínio surge uma nova economia agrícola, que foi a laranja, que perdurou dos anos 20 até a década de 80. Cabe ressaltar que Itaboraí se tornou o maior produtor dessa cultura no Rio de Janeiro, e 2º no Brasil chegando até a ser conhecida por “Terra da Laranja”. Já a arte em cerâmica esteve sempre presente na cultura e na economia do município, sendo registrada entre os nossos índios, nos próprios engenhos, que possuíam pequenas olarias para confecção em argila dos invólucros para transporte de açúcar, cuja tradição se perpetuou pelo século XX, ampliada pela indústria cerâmica que recebeu novas tecnologias na década de 40, mecanizando a produção.
Após experimentar um período de destaque na produção de laranja durante boa parte do século XX A partir de 1929), vê-se mais uma vez o declínio, pois as terras já não mais produziam laranjas de boa qualidade (O motivo não era o fato das terras serem cansadas e sim os erros na técnica de plantio, no transporte e colheita e a falta de adubação, mostrando o caráter especulativo do empreendimento), e a indústria ceramista, antes aquecida, não buscou novas tecnologias que fossem mais eficazes, ou menos poluentes, perdendo mercado para outras regiões e estados do Brasil. Porém, ao contrário da laranja, não se extinguiu, mas de grande empregador em meados do século XX, resume-se hoje a umas poucas unidades, sendo que algumas se aprimoraram.)
O fato que ora descrevemos e a construção da ponte Rio-Niterói aceleraram o processo de urbanização em Itaboraí, que torna-se uma “cidade-dormitório”, a partir da década de 70, estimulando uma especulação imobiliária que criou novos problemas ambientais na região, pois as antigas áreas de plantações de laranja foram convertidas em loteamentos sem nenhuma infraestrutura urbana em praticamente todos os distritos (cabe lembrar que não haviam políticas públicas organizadas, ou definidas de zoneamento urbano, e nem leis muito claras, à época, diferentemente de hoje), e isso trouxe sérios problemas para o município, que hoje assume todo o ônus desse problema, inclusive chegou a ser considerado, uma região de baixo IDH – Índice de Desenvolvimento Humano, como um dos municípios mais pobres do estado. Ainda hoje, Itaboraí tem boa parte de sua população empregada na capital, em Niterói, São Gonçalo e até em alguns municípios da Baixada Fluminense, mas vivemos uma inversão econômica com novos empreendimentos no município, transformando Itaboraí de satélite, ou dormitório, numa cidade pólo para pelo menos 12 municípios.

Vista parcial da localidade de Rio Várzea (ao fundo) no final da década 60 no século passado, bem diferente de hoje, 40 anos depois.



Mas uma outra forma de riqueza se tornou especialidade de Itaboraí durante toda a sua história: a de formar expoentes, seja na literatura, na política, ciências ou mesmo nas artes. E dentre eles podemos destacar José Leandro de Carvalho (1788-1834) que foi um grande pintor colonial, o dramaturgo João Caetano dos Santos ( 1808-1863); o primeiro Presidente da Província do Rio de Janeiro, Joaquim José Rodrigues Torres ( 1802-1873 ), o Visconde de Itaboraí; o sociólogo e jurista Alberto de Seixas Martins Torres ( 1865-1917 ); o romancista Joaquim Manoel de Macedo ( 1820-1882 ), autor de “A Moreninha” e o diplomata, escritor e acadêmico Salvador de Menezes Drummond Furtado de Mendonça ( 1841-1913 ).e Alberto Frederico de Moraes Lamego (1870-1951) — historiador.


Joaquim Manoel de Macedo
Agora, na primeira década do século XXI, uma nova mudança ocorre na região, que além do progresso e do desenvolvimento econômico com a instalação do Comperj – Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, um investimento de vulto que será construído numa área de 45 milhões de metros quadrados. A produção de resinas termoplásticas e combustíveis consolidará o Rio de Janeiro como grande concentrador de oportunidades de negócios no setor, estimulará a instalação de indústrias de bens de consumo que têm nos produtos petroquímicos suas matérias-primas básicas e irá gerar uma grande quantidade de empregos. Com isso, a história novamente se reescreve, colocando aquela mesma Itaboraí próspera do século XIX, na Itaboraí do novo milênio.
E imaginar que Itaboraí, de origem tão despretensiosa como uma parada de tropeiros, vê-se, com o passar do tempo, daquela dos grandes engenhos e portos, de grande influência econômica, e política no século XIX, e que cedeu ao Brasil grandes políticos, pensadores e artistas, e que agora, em pleno século XXI, volta a ser um oásis, e como sempre foi sua vocação, recebendo e abrigando pessoas de muito longe, que buscam novas oportunidades, e que trazem também, novas esperanças, e que ao escolher esta terra como sua terra, estão, com o seu bravo povo que amam a sua memória, construindo uma nova história.

Prof. Cláudio Rogério S. Dutra


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